Itália

As fotografias da nossa exposição digital mostram histórias de vida de jovens que se mudaram para Itália vindos de diversos cantos do mundo. Entre estas narrativas encontram-se relatos de migrantes de segunda geração, que nasceram em Itália e transmitem intimamente as experiências herdadas dos seus pais.
As histórias abordam três questões principais:
– O significado da fotografia no percurso pessoal dos jovens migrantes, destacando os desafios que eles ou os seus familiares enfrentaram durante a mudança para Portugal, bem como as suas conquistas ou marcos desde a migração;
– Os sentimentos que surgem quando falam da sua terra natal com os familiares;
– As suas aspirações de regressar ao seu país natal para viver ou visitar.

Preservámos a linguagem e o estilo autênticos das histórias para garantir a sua representação genuína.

– Para mim, esta foto representa uma ponte entre o meu passado e o meu futuro. É a vista do lago perto de Tirana, um local que me lembra dos domingos passados com amigos e das gargalhadas que ecoavam pelas montanhas. Quando tive de deixar a Albânia para estudar medicina, este lago tornou-se num símbolo da minha determinação e esperança. Mudar-me para um novo país sozinha foi um grande desafio. Tive de lidar com a solidão, a dificuldade de integração numa cultura diferente e todo o trabalho árduo que envolve estudar medicina, especialmente numa língua que não é a minha língua materna. Contudo, tenho orgulho em dizer que agora sou residente e que, a cada dia, estou mais próximo do meu sonho de me tornar uma médica de pleno direito. Este feito não é apenas um sucesso pessoal, mas, também, uma forma de honrar as minhas raízes e o apoio que sempre recebi da minha família. – Quando falo da minha terra natal com a minha família, sou assoberbada com memórias. Lembro-me das ruas onde brinquei em criança, os festivais e os aromas das comidas da minha avó. – Estas conversas enchem o meu coração com nostalgia e amor pela minha terra natal. Felizmente, regresso frequentemente à Albânia, mas não tantas vezes quanto desejava.
– Esta foto é da floresta de Krusevo. Faz-me pensar na minha casa e nos tempos com os meus amigos. Estudar economia em Inglês é complicado, mas eu avanço e aprendo. Estou orgulhoso disso. – Quando falo da Macedónia com a minha família, sinto imensas saudades. Tenho saudades das festas, dos jogos, da minha avó. Penso sempre nessas coisas. – Quero voltar à Macedónia para visitar, mas não para ficar. É pobre.
– Isto é tavë kosi. É um prato típico de festa. Eu não estou cá sozinho, mas com o meu irmão e primos. Por vezes, fazemos este prato juntos e sentimo-nos de volta a casa. – Falar sobre a minha terra natal com os familiares faz-me sentir muito, como se diz… emocional. Eu sinto falta das tradições, das paisagens e especialmente do sentido de pertença, que deixei para trás na Albânia. – Não sei. Visitar sim, mas viver lá, não sei.
– Isto é a memória da Albânia para mim. Tenho saudades. – Quando falo da Albânia, sinto-me triste. Tenho saudades. – Eu gostaria de voltar à Albânia, talvez para viver ou só para visitar.
Isto é o mercado de Karachi. É simplesmente maravilhoso. – Quando falo do Paquistão com a minha família, fico feliz, mas também triste. – Lembro-me da nossa cultura e do nosso povo, mas também me sinto distante.
– ISTO É O PAQUISTÃO. – Quando se fala do Paquistão, é difícil. Sinto saudades. – Eu quero voltar para o Paquistão, mas não é fácil.
– Esta foto é CASA PARA MIM!!! – Eu trabalho aqui, é difícil, mas estou orgulhoso de falar sobre o Bangladesh com a minha família todos os dias. Sinto saudades das festas e das pessoas. – Não sei, talvez. Visitar sim.
– Esta é a minha cidade. – Sou negro e sinto orgulho em falar de Camarões, dá-me mais saudades. – Apenas para visitar.
– Apollonia é as nossas raízes. Nós somos Ilírios. Sinto-me orgulhoso, eu estudo economia e trabalho para me sustentar. Quando volto a casa, sinto-me orgulhosa. – Ao falar sobre a Albânia com os meus familiares, sinto-me melancólica. – Eu gostaria de visitar e talvez até viver lá.
Isto é para fazermos o nosso próprio café. Sinto-me em casa. – Quando falo sobre a Albânia, sinto saudades. Eu gosto de relembrar. – Eu quero voltar, talvez para viver ou apenas para ver.
– Mudar de país e de estilo de vida é muito difícil e marca-nos muito, especialmente quando não falamos ou falamos pouco a língua do novo país. – Na verdade, estou a estudar na Albânia, o país do meu pai. Aproximei-me das minhas raízes, o que é algo que gostaria muito de fazer de novo. Também seria bom visitar a Polónia.
– Nesta fotografia vê-se o meu gato na Moldávia, que já não está aqui. Representa-me não só porque gosto de gatos, mas porque ele esteve sempre presente e, mesmo que desaparecesse durante algum tempo, voltava, ao contrário do meu pai. – O maior sacrifício foi feito pela minha mãe, ela e o meu novo pai italiano, com quem casou depois de se divorciar do meu pai biológico, que tinha problemas com o álcool. Trouxe-me a mim e à minha irmã para Itália, para um país com uma língua, uma cultura e um estilo de vida diferentes. Onde aprendi a língua, fiz amigos e afeiçoei-me a este novo estilo de vida. – Para viver, não, porque, à exceção da capital, é um país pobre, onde não vejo um futuro para assentar. Para o visitar sim, porque apesar da pobreza tenho belas recordações da minha infância, do sítio onde nasci.

– Sim, uma bússola.
– Este objeto é um presente que a minha mãe me deu e que o pai dela lhe tinha oferecido, sabendo que ela iria querer viajar muito. O meu avô morreu antes de saber que a minha mãe vinha para cá. Por isso, ela deu-mo, como um desejo de boa viagem.
– Os meus pais não têm uma boa relação com o Senegal. O meu pai estava na política e teve muitos problemas por causa disso. Foi também por isso que ele e a minha mãe vieram para cá. E antes disso, para a Alemanha e Bélgica. Não gostam de falar do Senegal, o meu pai diz que o atual presidente é tão corrupto como todos os outros.
– Só lá estive uma vez, há muitos anos. Depois não me quiserem mais levar.

Não. – Sim, para visitar.
– Não tenho uma fotografia porque era pequeno. Não tenho uma fotografia, mas era feliz. – Porque estava com os meus pais. – Para visitar.
– São imagens de dinheiro da Índia. São as rupias (a moeda do meu país) que guardei no bolso durante a viagem a Itália e que são agora o meu amuleto da sorte. – Quando viemos para Itália, eu e o meu pai deixamos a nossa família na Índia para vir trabalhar para cá. Estávamos sozinhos, eu cuidava da casa e ele trabalhava para senhores importantes. Agora ele é cuidador e também trouxe a minha mãe e as minhas irmãs mais novas para cá. Agora todos nós trabalhamos e temos uma casa pequena mas boa. Eu terminei a escola e agora quero ser esteticista. – Sinto falta da Índia, mas gosto de viver aqui porque posso ser uma rapariga mais livre, ir à escola e não tenho de me casar jovem ou ter filhos.
– O brinco da minha avó. – A minha avó (mãe da minha mãe) era muito importante para mim. Deixamos a Índia em 2018 e a avó faleceu enquanto estávamos cá. Ela era como uma outra mãe para mim. Agora ando sempre com o brinco dela comigo e sinto-me muito próxima dela. – Sim, gostaria de regressar porque não me adapto muito bem aqui, porque trabalho sempre com os meus pais e não vou à escola.
– Sim, e este objeto é um pequeno bloco com cartas dentro. Este pequeno bloco está cheio de cartas escritas por pessoas muito queridas para mim. – No início da minha viagem, recordou-me o quanto era amada e quantas pessoas me apoiavam, mesmo que estivessem fisicamente distantes. Quando eu e a minha mãe chegámos a Itália, surgiu a pandemia de Covid-19, tornando a nossa integração na sociedade italiana muito mais difícil. O confinamento obrigou-nos a ficar em casa, sem trabalho ou escola. A falta de trabalho levou-nos a graves dificuldades económicas. Quando as restrições diminuíram, procurámos casa por todo o lado, mas deparamo-nos frequentemente com preconceitos. Com a introdução da lei que concede autorizações de residência aos trabalhadores, a minha mãe e eu tivemos a oportunidade de obter uma. Ao fim de três anos, consegui finalmente obter a minha autorização de residência, o que me permitiu regressar ao meu país de origem e rever os meus entes queridos após tanto tempo. Agora, passados mais de quatro anos, posso dizer que o nosso objetivo de ter uma vida melhor foi alcançado. – Não há dúvida de que, sempre que visito, sinto-me cheia de alegria e de pertença. Tento fazê-lo o mais frequentemente possível, porque é lá que me sinto verdadeiramente em casa. Ao mesmo tempo, nutro o desejo de poder voltar a viver lá, tendo em conta os progressos notáveis que o país fez entretanto.
– Gostaria de regressar ao meu país de origem para o visitar. Atualmente, não tenciono ficar lá a viver permanentemente.
– Sim. Este inverno fui a Marrocos (o meu país natal) e visitei a Mesquita Hassan II. Construída a mando do rei Hassan II e inaugurada em 1993, é a maior mesquita de Marrocos e uma das maiores do mundo. – Escolhi esta imagem não só porque representa um monumento histórico/artístico, mas também cultural, sendo um país de maioria muçulmana. Por isso, penso que é a mais adequada para representar simbolicamente as minhas origens. Tendo emigrado ainda muito jovem, o conceito de emigração sempre me acompanhou, principalmente na escola. Como toda a gente, não sabia a língua, mas graças à ajuda dos professores e muito empenho e força de vontade, consegui aprender a língua italiana em poucos meses. Para mim, isto já é um grande sucesso pessoal que me conduziu até quem sou hoje, agora que estou totalmente integrada, o meu “último desafio” é usufruir dos direitos que me foram concedidos e mostrar a todos que apesar de termos uma nacionalidade diferente, tanto a nível político como humano, somos iguais sem distinção. – Tenho o desejo de regressar ao meu país de origem para o visitar.
Não. Nada. – Atualmente, o meu país de origem (Equador) está a atravessar um período bastante grave, um estado de alerta, pelo que iria visitar a minha família, mas não voltaria a viver lá.
– São os meus cadernos escolares. – Era muito importante para os meus pais mandarem-me para a escola, especialmente porque nasci em Itália e eles queriam que eu fizesse tudo como as crianças italianas. Eles não terminaram a escola e tiveram sempre uma vida má na China devido a questões políticas: foi por isso que vieram para Itália. Para eles, vir para cá e saber que eu podia crescer como uma italiana era um motivo de orgulho. – Gostava muito. Nunca lá estive, no entanto também é um pouco a minha casa. Porém, tenho um pouco de medo de ir, mas acima de tudo não quero chatear os meus pais nem fazê-los sofrer.
– DVD de Domenico Modugno. – O meu pai, quando veio para Itália, comprou um DVD de Domenico Modugno e ouvia-o sempre, os meus irmãos e eu crescemos com as canções deles. Para o meu pai, as suas canções são como as bandas sonoras desse período da sua vida, tendo-o acompanhado durante todo o seu tempo. – Não tenho qualquer vontade de ir viver para lá, mas um dos meus desejos é poder visitar tudo.
– Aeroporto Nene Tereza, Tirana, ALB. – O aeroporto marca a fronteira entre o passado e o futuro, um lugar cheio de emoções contraditórias. Foi aqui que me despedi da minha vida antiga, com todas as suas raízes e laços afetivos, para embarcar numa viagem para um território desconhecido. O momento da partida foi um turbilhão de sentimentos, entre o entusiasmo pelas novas aventuras e a ansiedade pela incerteza do amanhã. No aeroporto, as lágrimas foram o protagonista, tanto para mim como para os meus pais. Foi um momento pungente, em que as emoções transbordaram livremente. As lágrimas representavam um misto de tristeza por nos despedirmos de pessoas e lugares queridos, mas também de esperança pelas oportunidades que nos esperavam no novo país. Olhando para os meus pais, que tanto se sacrificaram para nos garantir um futuro melhor, senti uma profunda gratidão, mas também um sentido de responsabilidade. Apesar da dor da separação e do medo de um futuro incerto, enfrentamos esse momento com determinação e coragem. As nossas lágrimas eram um sinal dos laços familiares e do amor, mas também da força interior que nos ajudaria a ultrapassar os desafios que se avizinhavam. E assim, com o coração apertado mas cheio de esperança, atravessámos aquele limiar, prontos para enfrentar um novo capítulo das nossas vidas. Os desafios pessoais que enfrentei durante a minha imigração parecem insignificantes perante a determinação dos meus pais. Foi particularmente difícil ver duas pessoas com mais de 50 anos a adaptarem-se a uma nova vida apenas para garantir um futuro melhor para os seus filhos. Encontrar trabalho, aprender uma nova língua, tentar fazer amigos – são desafios que enfrentamos juntos. Todos estes desafios provocaram sentimentos de isolamento e nostalgia do que deixamos para trás. No entanto, apesar destas dificuldades, mostrámos uma força extraordinária ao tentar adaptar-nos e construir uma nova vida num ambiente completamente diferente. Enfrentamos os desafios com coragem, encontrando formas de ultrapassar os obstáculos e de nos integrarmos na nova comunidade. – Regressar ao meu país de origem desperta sempre em mim sentimentos contraditórios, porque as coisas mudaram durante a minha ausência. Não tenho a certeza se gostaria de voltar a estabelecer-me lá, mas uma coisa é certa: acho que nunca encontrarei noutro lugar a mesma felicidade que no meu país de origem. Continuarei a visitar o meu país frequentemente, porque mesmo que não tenha a certeza de querer voltar a viver lá, sinto uma forte necessidade de me reconectar com as minhas raízes e com os lugares que contribuíram para formar quem sou.
– Durante os primeiros três meses da guerra (03/04/2022-06/03/2022), fui para a Polónia sem os meus pais e familiares, com uma mala. Na véspera da viagem, a mãe da minha melhor amiga cedeu-me o seu lugar no abrigo da escola polaca e, após exatamente sete horas de preparação, o meu pai levou-me ao local de encontro das crianças através dos postos de controlo militares. Lembro-me de como conduzimos – 30 crianças com idades compreendidas entre os 11 e os 17 anos – e discutimos que a guerra iria continuar durante um máximo de 2 a 3 semanas, enquanto três adultos que nos acompanhavam colavam o letreiro “Crianças” nas janelas, e depois todos o fizeram na esperança de que os soldados russos vissem os letreiros e não disparassem contra os autocarros (como viemos a saber mais tarde, isto não ajudou quase ninguém). – Esta fotografia foi tirada em 27/03/2023. Passou pouco mais de um ano desde o início da guerra na Ucrânia e 10 meses desde que regressei à Ucrânia. Durante uma viagem escolar com os meus colegas, perto do “coração da Ucrânia”. É uma estrutura arquitetónica cujo centro imitava vibrações e à volta da qual se erguiam pilares com os nomes de todas as cidades da Ucrânia. Estou ao lado de um pilar com a inscrição da minha cidade. Então, senti-me em casa e acreditei que, apesar da guerra, podia fazer planos no meu país natal. O meu irmão tem uma deficiência grave, pelo que os meus pais não se atreviam a sair de casa. No entanto, a minha tia convenceu o meu pai a visitar Itália durante pelo menos duas semanas e a tentar encontrar um sítio adequado para viver. E assim aconteceu, 2 dias de viagem, 2 semanas à procura de alojamento, o segundo ano da guerra e eu estava novamente no estrangeiro. Claramente, desta vez, a mudança foi mais lenta, porque tive de me concentrar em ajudar os meus pais e em construir uma nova casa, também compreendo as razões desta decisão, dado que não podemos dizer com certeza durante quanto tempo irá durar a última guerra, mas mesmo assim não posso deixar de assumir a minha responsabilidade de compreender, apoiar e responder honestamente à pergunta “O que é que eu quero?” – É muito provável que, após o fim da guerra, regresse à Ucrânia, ou talvez, após anos de vida aqui, quando estiver muito ligado a este lugar, faça um compromisso com a minha consciência e ajude a minha pátria a partir do estrangeiro.
– Sim. – O sacrifício que os pais migrantes fazem ao irem para um lugar desconhecido, sem conhecerem a língua ou aquilo que os espera, apenas para garantir um futuro melhor para os seus filhos. – Não vivo lá, mas visito todos os anos.
Não. – Só falo com a minha mãe e com a família dela. – Só para visitar.
– Sim, é o meu primeiro dicionário de italiano. – Uma prenda de uma senhora que vivia perto da nossa primeira casa em Itália. Ela era professora. Foi difícil para mim aprender italiano. Eu sabia francês, mas o italiano é diferente. Mais complicado para mim. Este dicionário recorda-me a bondade das pessoas que me acolheram. Visitei uma vez, mas correu mal. – Gostaria de ter uma mulher italiana para que os meus filhos fossem italianos e um pouco camaroneses.
– Sim, este é um instrumento musical do Senegal, chama-se kora. – Foi a única coisa que o meu pai trouxe com ele do Senegal. E quando eu era criança, ele tocava-o à noite, antes de eu adormecer. Tenho estado muito no Senegal. – Agora já não vou desde antes da pandemia porque se tornou um pouco complicado. Tenho lá todos os meus avós que ainda estão vivos.
– Envio-vos o meu diário. – Escrevo nele todas as noites. Comprei-o no mercado da minha cidade natal na única vez que lá fui. Para mim, escrever no diário é como tirar fotografias de pensamentos. No entanto, quando toco na capa, fico com saudades do Senegal. Mas tenho sorte porque a minha mãe, o meu pai e a minha avó estão aqui comigo e tenho tudo o que preciso. A minha família chegou aqui muito pobre, mas agora trabalhamos nos mercados, vendemos roupa. As coisas estão um pouco melhores. Estou a tirar o meu diploma. Gostava de ser secretária e comprar uma casa bonita. – Já fui ao Senegal quatro vezes, sempre com a minha avó, porque os meus pais estavam a trabalhar. Mas não me sentia livre.
– Esta é uma fotografia da minha cidade. – Tenho muitas saudades da minha cidade, porque os meus pais estão lá. Vim para cá com um tio e primos para estudar e procurar um futuro melhor. – Só falo do Senegal com o meu primo mais velho, porque pensamos que quando ganharmos algum dinheiro podemos voltar e comprar uma casa para os meus tios e os meus pais viverem juntos. O meu tio não fala comigo, ele sofre demasiado. – Sim, não quero casar aqui em Itália.
– Sim, é a minha caneta da sorte. – Não é uma caneta muito cara, mas guardo-a sempre na minha mochila ou na minha mala. Assinei todas as coisas importantes com ela e nunca a deixo, de facto, está na minha carteira. Foi-me oferecida por uma senhora no local onde trabalhei pela primeira vez. – Cheguei à Itália quando ainda era recém-nascida. Pode dizer-se que nasci aqui. O meu pai morreu há alguns anos e eu ajudei a minha mãe e os meus irmãos. A minha mãe encontrou outro homem, também nigeriano, e casaram-se. Agora consideramo-nos italianos, pensamos pouco na Nigéria, só nos feriados importantes e então usamos as nossas roupas tradicionais ou quando fazemos o Ramadão como antigamente. – Sim, porque o meu pai está num cemitério na Nigéria.
– Sim, é um vestido tradicional nigeriano. – Tenho muitas roupas que vêm do meu país, mas não as posso usar sempre, nem na escola nem para sair, porque iriam gozar comigo. No entanto, uma vez vesti-o num casamento e toda a gente me elogiou e fiquei muito feliz. Muitas são roupas da minha mãe, que ela trouxe quando veio para Itália. Também as uso para a agradar. – O meu pai vende produtos nigerianos, roupas, sapatos, malas. Por isso, de seis em seis meses, vai à Nigéria com alguns familiares para ir buscar os produtos. Estamos bem financeiramente. Não posso ir sempre porque os bilhetes custam dinheiro. A última vez foi no ano passado e a minha mãe também lá esteve. Eles têm saudades, mas nós estamos bem em Itália, temos uma boa vida e uma boa casa, fora da cidade. As pessoas respeitam-nos e preocupam-se connosco. A minha prima casou-se com um rapaz de Taranto! – Como disse, volto lá regularmente. Mas acho que não voltaria a viver lá. Sou mais italiana do que nigeriana.
– Sim, uma matrioska. – Sim, é esta matryoshka da minha avó paterna, que é russa. Ela deu-ma quando eu nasci. Ela morreu há muitos anos na Rússia, mas guardo-a comigo porque conta a história dela e da sua família. – Os meus pais voltaram a viver na Bielorrússia porque nunca se deram bem aqui. Eu, por outro lado, sinto-me agora um pouco italiana. – Não, porque agora a Bielorrússia não é um país livre e pode entrar em guerra muito em breve. Não é algo que queira para mim.
– Sim. – É um Alcorão do meu pai. Eu não sou muito muçulmano, mas o meu pai e a minha mãe são. Eles estão agora no Senegal, mas eu fiquei em Itália e trabalho em comércio. No entanto, este livro para mim representa os meus pais. – O meu pai sempre disse que ir para fora implica regressar ao Senegal com uma boa posição. Eu não acredito muito nisso. Ele quer que eu volte para lá, mas eu agora sou metade italiano e quero tornar-me cidadão. – Não, apenas para me encontrar com os meus pais.
– Para cima. – Estes são os sapatos da minha mãe quando se casou. Usou um vestido branco como se usa em Itália, estava linda. Mas as fotografias ficaram no Senegal. Ela e o meu pai estavam noivos quando vieram para cá e casaram em Itália. Para a minha mãe, são o sinal de uma nova vida que está a começar. Ela deu-mas como amuleto da sorte. – Os meus pais nunca voltaram ao Senegal, porque o meu pai discutiu com toda a sua família. Por isso, em casa, falar do Senegal deixa-me um pouco triste. – Sim muito, mas para ir quero pôr dinheiro de lado, porque o meu pai não me dá.
– Sim, uma boneca. – É um brinquedo (boneca) que uma senhora me deu quando estava no hospital, aqui em Itália, para me calar. Está toda estragada, mas para mim era muito bonita, porque os brinquedos no Senegal não são tão bonitos e não há Barbies, só bonecas de trapos ou de pano. – Os meus pais estão muito ligados ao Senegal e regressam de vez em quando, quando têm dinheiro. Os meus avós estão todos vivos, mas não quiseram vir para Itália. Temos muitos amigos aqui e um irmão da minha mãe e mantemos as tradições com eles. Acolheram-nos bem aqui, Taranto é bonito. Só que o meu coração está noutro lugar. Os meus pais sofrem muito, eu sofro menos, porque nasci aqui. – Sim, muito, a minha irmã e eu não vamos lá desde antes da pandemia.
– Sim, uma saia tradicional. – É a única roupa que tenho como recordação do meu país e uso-a em dias de festa. Antes de ser minha, era da minha mãe – Os meus pais sempre me ensinaram as tradições e ficam contentes quando me visto como uma senegalesa. Por outro lado, ficam zangados quando me visto demasiado como uma ocidental porque pensam que vou perder as minhas origens. – Não muito, teria medo, não é um lugar seguro para uma rapariga.
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